As meditações cabalísticas de Shalom
Sharabi
(Ariel Bar Tzadok)
O Rashash (acrônimo de Rabi Shalom Sharabi) organizou as kavanot
de Isaac Lúria de forma precisa, acrescentando o que lhe foi ordenado
diretamente por Elyahu Hanavi (profeta Elias). De acordo com a tradição
sefaradita, antes de sua morte, o Ari disse aos seus alunos que se eles
tivessem mérito ele voltaria ao Gilgul e continuaria a ensiná-los. Nossos
sábios dizem que o Ari cumpriu a sua promessa e reencarnou como Rashash.
O Rashash foi respeitado como líder comunitário muito além do
confinado círculo dos cabalistas. Como são todos os cabalistas sefaraditas, ele
foi mestre em curas e milagres. O episódio mais famoso sobre as habilidades e
poderes de Rashash ocorreu num Shabat.
Um membro de seu grupo engoliu acidentalmente uma poção de
veneno e ficou à beira da morte. Seus colegas correram para pedir socorro ao
Rav Sharabi. Ele chamou um Sofer Stam (um escriba de Torah) e instruiu-o a
escrever um número específico de Nomes Divinos num pergaminho, e esse
pergaminho foi dobrado e engolido pelo doente. Como era uma questão de vida ou morte,
Sharabi violou o Shabat (Pikuah Nefesh Doheh HaShabat, um caso de vida ou morte
supera a observância do Shabat). Logo depois de engolir o pergaminho, o aluno
se recuperou. O texto que Shlomo Sharabi usou para salvá-lo ainda é usado hoje
em dia pelos cabalistas.
A maior contribuição de Rashash é o seu livro Nahar Shalom,
que detalha segredos das meditações e kavanot. Esse texto foi recebido tão bem
pelos cabalistas que hoje em dia é publicado como a parte III do Etz Chaim,
do rabi Chaim Vital. Outra grande contribuição do Rashash é o seu Sidur,
conhecido como Sidur HaRashash. Esse Livro de Orações tornou-se um padrão
de Sidur cabalístico, usado tanto por cabalistas sefaraditas quanto por
cabalistas asquenazitas.
Muitos judeus, hoje em dia, inclusive os religiosos, não têm
a menor idéia da vastidão cabalística das kavanot que subjazem às orações e que
são exatamente essas kavanot que dão às orações o seu poder e significado. São
as kavanot (através das orações) que fazem com que as orações sejam ouvidas
Acima. É por essa razão que quando rezamos, recitamos a L´Shem Yichud, que
conclui com as palavras “L´Shem Kol Yisrael” (em nome de toda Israel), o que
significa que quando fazemos as nossas orações não o fazemos como indivíduos,
mas como parte de uma nação. Assim, quando as orações dos cabalistas sobem, as
nossas orações sobem com as deles.
Em alguns sistemas, hoje em dia, se decidiu que não é
necessário rezar com kavanot, afirmando-se que não se precisa disso porque se
sabe o que as kavanot significam, e que é necessário apenas rezar com o
significado correto. Essas pessoas realmente não fazem idéia de como a Shefa
realmente desce, e quando eu perguntei a alguns desses “entendidos” que me
explicassem conceitos básicos das kavanot (por exemplo, como fazer descer a
Shefa na palavra “Baruch” em qualquer benção) eles foram completamente
incapazes de fazê-lo. Eles me ofereceram explicações de mussar e de chassidut,
mas não de kabbalah, e por isso eles não são capazes de fazer os Yichudim
apropriados Acima.
Não é fácil aprender a fazer kavanot. Um requisito básico
para isso é ter conhecimento completo de todo o sistema do Arizal. E ainda
assim, a pessoa precisa estudar muito o Shaarei Kavanot (especialmente o Sexto
Portão, do Chaim Vital, que reúne os ensinamentos do Ari), e precisa conhecer
também o Sidur HaRashash. Embora seja um empreendimento difícil, ainda assim
não é impossível. Muitas pessoas, inclusive os Baalei Teshuvá estão estudando
com sucesso o sistema de Rav Sharabi hoje em dia.
Entendendo as Kavanot
Kavanot não são apenas meditações cabalísticas sobre o
significado dos conceitos gerais expressos nas orações. Na verdade, as kavanot
têm mais a ver com as letras das orações do que com as palavras. As kavanot são
o poder subjacente de cada palavra e de cada letra de uma oração. A oração,
conjugada com as kavanot, é o canal específico através do qual a energia de
Hashem, que se chama Shefa, é canalizada para a Terra.
Shefa é uma energia real, não é algo simbólico. É o poder que
é usado pelos profetas e pelos cabalistas, e que os habilita a atuarem com as
mais altas leis da natureza metafísica (milagres). A Shefa, a fim de ser
recebida, precisa ser canalizada desde a sua fonte, através de um caminho
apropriado, e precisa, no final do processo, repousar sobre um objeto
específico, ser ou coisa, de tal forma que a sua energia (da Shefa) ali se
manifeste. Neste aspecto, a Shefa é algo parecido com a energia elétrica.
Eletricidade é algo que está no ar, embora nessa forma nós não podemos usá-la
para fazer funcionar os utensílios elétricos. Primeiro, a energia precisa ser
produzida e armazenada, para só depois ser distribuída. Ela então viajará por
um intrincado sistema de fios e de estações-de-força até chegar em nossas
casas. E lá, dentro da casa, o aparelho que vai usá-la precisará estar
conectado à tomada. Ainda assim a energia elétrica não fluirá enquanto não autorizarmos
o a aparelho a recebê-la, ligando-o. A canalização da Shefa opera do mesmo
modo.
A Shefa existe, primordialmente em Ayin Sof, que é o estado
absolutamente desconhecido de D´us. Ela está armazenada em Adam Kadmon, que é o
padrão genérico do Universo Supernal de D´us (Keter, no Partzuf de Ática
Kadisha, Arik Anpin e Zeir Anpin). De lá, a Shefa precisa ser canalizada
corretamente através dos caminhos completos e apropriados através de todos os
níveis objetivos e subjetivos dos planos espiritual (Atzilut), mental (Beriá),
verbo-emocional (Yetzirá) e físico (Assyiá) a fim de ser recebida aqui, no
mundo material, para a realização da função para a qual foi puxada para baixo.
Mitzvot e orações são os veículos escolhidos para isso. Kavanot são as formas
espirituais de comunicação, e as nossas mitzvot diárias e as nossas orações
fornecem o “sistema de fiação” para que a Shefa seja puxada para baixo e
aproveitada em nossas vidas. Assim, cada ação nossa, cada letra e cada palavra
das nossas orações, é um código que representa o tipo, a direção, a intensidade
e o fluxo da Shefa. Por essa razão, por exemplo, quando recitamos uma benção,
agradecemos a Hashem com uma fórmula específica. Por exemplo, nós recitamos: “Baruch
Atah Hashem Elokeinu Melech HaOlam”, que significa “Abençoado és Tu, Hashem,
nosso D´us, Rei do Universo”. Essa frase é um código secreto, em que cada letra
representa uma multidão de coisas, com significados múltiplos. O “Sistema de
fiação espiritual” é o caminho que a Shefa toma desde a sua fonte em Ayin Sof,
o Absoluto, através das Sefirot, que são os filtros de Hashem, até a Terra, os
nossos corpos e as nossas vidas. O poder que movimenta a Shefa são as nossas
intenções, os nossos pensamentos, os nossos desejos, ou seja, as nossas
kavanot. Esse é o segredo do verdadeiro poder espiritual e que complementa a
observância das mitzvot.
A função da canalização da Shefa é imaginar o seu movimento
em nosso “olho da mente” e ativar essa visão, fazendo-a real, pelo poder e pela
conexão que temos com o “Desejo Supremo”. Em cada uma das palavras que
recitamos nas orações cabalísticas, existe um código específico sobre o nível
em que estamos, que tipo específico de Shefa está sendo direcionado, pronto
para ser “colhido” e movimentado pela próxima palavra da oração. Os Nomes
Divinos listados dentro de cada palavra da oração não são Nomes (ou palavras
mágicas) para serem recitados, mas são “sinalizações” através do caminho que a
Shefa toma no descenso ou no ascenso. Os Nomes Divinos são usados da mesma
forma como se usam as fórmulas matemáticas para se expressarem as leis e os
conceitos da física. Portanto, olhar para os Nomes Sagrados como se eles fossem
símbolos de uma Realidade Superior é um sério e grave erro.
(Tradução de Charles Kiefer)
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