A vida de Shimon Bar Yochai
(Tradução de Poliana Pasa)
O santo erudito da Mishná, Shimon bar Yochai, nasceu
aproximadamente cinquenta anos após a destruição do Segundo Templo, que ocorreu
no ano 70 da Era Comum. Há diferenças de opinião sobre o dia do seu nascimento.
Alguns identificam a data de Lag BaOmer como o dia de sua morte. Outros, o dia
do Festival de Shavuot, dia da outorga da Torá.
No volume Nachalas Avos,
lemos que seu pai, Yochai, pertencia à tribo de Judá. Um dos líderes
reconhecidos de sua geração, era altamente respeitado, próspero, e tinha laços
próximos com autoridades do governo. Sua esposa, Sarah, era descendente de
famílias principescas, e podia traçar sua ancestralidade até o renomado erudito
Hillel, o Ancião, fundador da dinastia dos Sábios que lideraram o povo judeu
até aproximadamente o século V.
Sarah não teve filhos por muitos anos. Como o tempo passava e ela parecia
não ser capaz de gerar descendência, Yochai considerou divorciar-se dela.
Quando a esposa soube disso, não disse nada, mas voltou-se ao Criador. Fazia frequentes
jejuns, rezava intensamente, derramando lágrimas em súplicas para que o marido
não se divorciasse dela. Ela também fazia doações generosamente e procurava
toda oportunidade de fazer bons atos e praticar a gentileza.
Os céus ouviram suas súplicas, viram seus bons atos, e suas
orações foram atendidas. Na noite de Rosh Hashaná, o ano novo judaico, Yochai
teve um sonho comovente. Ele viu a si mesmo em uma enorme floresta repleta de
milhares e milhares de árvores. Algumas eram verdes e tinham frutos, enquanto
outras eram secas e estéreis. A árvore na qual ele se apoiava estava seca e sem
folhas.
Ele olhou para cima e viu uma figura que despertou temor e
reverência. No ombro, o homem carregava um cantil de água. Ele atravessou a
floresta regando algumas das árvores secas e ignorando outras, apesar de estar
passando bem ao lado delas. Quando chegou à árvore em que Yochai estava
encostado, o homem tirou um cantil menor, cheio de água fresca, e irrigou a
árvore. Yochai pôde ver que havia uma bênção nessa água especial. Apesar de
ser, a princípio, uma quantidade pequena, a água dilatou e logo cobriu todo o
solo ao redor da árvore. Além disso, a árvore imediatamente floresceu, deu
frutos, e cresceu em proporções imensas. No sonho, Yochai sentiu grande alegria
diante da visão maravilhosa. Ele acordou com o coração repleto de contentamento
e, espontaneamente, um verso dos Salmos veio aos seus lábios: “Somente Ele pode
transformar uma mulher estéril em alegre mãe de vários filhos. Aleluia!”
(Salmos 113:9).
Ele descreveu o sonho à esposa, dizendo: “Eu tive um sonho e acho
que o seu significado é simples: a floresta representa o mundo, e as árvores,
as mulheres no mundo. Algumas têm filhos, outras são estéreis. Em Rosh Hashaná,
no Ano Novo, o Firmamento declara que algumas das que são estéreis devem
conceber filhos. Essas são as mulheres cujas árvores são regadas com água de
nascente. Elas vão conceber filhos justos e sábios.”
“No entanto, uma coisa não está clara para mim. Por que todas
aquelas árvores foram regadas com um jarro, enquanto a árvore em que eu estava
encostado foi regada com um cantil menor, especial?”
A esposa, Sarah, respondeu: “A sua pergunta é boa. Deixe-me ir ao
Rabino Akiva e contar a ele sobre o sonho, e ele nos dirá o que significa.”
O marido, Yochai, respondeu: “É uma boa ideia. Iremos juntos e lhe
contaremos o sonho, e ele, com o sagrado espírito que D’us lhe deu, nos
revelará o seu significado.”
Após o término de Rosh Hashaná, o casal foi até o santo Rabi
Akiva. Yochai descreveu seu sonho. Rabi Akiva o interpretou assim como Yochai
havia dito. E também lhe disse porque a sua árvore havia sido irrigada com o
pequeno cantil especial. “Você deve saber, Yochai, que o seu sonho é uma
parábola para as mulheres que concebem filhos, e para aquelas que são estéreis.
A sua esposa Sarah é uma das que foram destinadas a serem estéreis. Apenas o
fluxo constante de lágrimas que ela derramou em oração foi capaz de mudar o seu
destino perante D’us. O cantil que você viu no sonho continha as lágrimas que
D’us coletou quando ela derramou seu coração a Ele, e é a partir delas que a
sua árvore foi irrigada.”
Rabi Akiva se virou para Sarah e disse: “Neste ano você vai
conceber um filho que será como uma luz para Israel em sua sabedoria e em seus
atos.”
Yochai e Sarah se alegraram muito com as palavras do sábio. Eles
foram contentes para casa. Como Rabi Akiva previu, Sarah deu à luz um menino no
Shavuot seguinte, o dia em que a Torá foi outorgada ao povo de Israel. A casa
se encheu de luz e alegria. Uma aura especial de santidade pairava sobre o
bebê, e todos previram que ele cresceria para iluminar o caminho de Israel com
a sua sabedoria. No dia do seu brit
(circuncisão), os pais doaram muito em caridade e rezaram intensamente aos
Céus. Eles deram à criança o nome “Shimon”, proveniente da palavra “Shemá” (ouvir)
para lembrar que D’us ouvira as suas orações e lhes concedera um filho.
Daquele dia em diante, eles tinham olhos apenas para o filho. Eles
o protegeram de toda e qualquer coisa profana, e o criaram na máxima pureza e
santidade. Quando ele começou a falar, eles o treinaram na língua pura e sagrada.
Quando ele tinha cinco anos, o matricularam na escola estabelecida pelo Rabi
Gamliel, em Jerusalém, e Shimon alcançou a excelência em seus estudos. Mesmo
muito jovem, ele fazia perguntas aos santos estudiosos da Mishná, Rabi Yehoshua
filho de Chananya e Rabi Gamliel. Assim, ele cresceu mais e mais na Torá, até
que se tornou um erudito excepcional.
Além das centenas de ocasiões em que a sua opinião é citada no
Talmude, Rabi Shimon escreveu diversos trabalhos em paralelo. Entre eles estão
a Michilta de Rashbi, sobre o Livro do Êxodo; o Sifri, sobre os livros de
Números e Deuteronômio; e o mais conhecido, o grande corpo esotérico de
sabedoria divina conhecido como o sagrado Zohar, o Livro do Esplendor.
Rabi Shimon foi genro do santo estudioso da Mishná, Rabi Pinchas,
filho de Yair. Ele faleceu no trigésimo terceiro dia do Omer, no ano de 3020.
Seus professores
Rabi Shimon bar Yochai foi discípulo do Rabi Yehoshua e do Rabi
Yehuda, filho de Baba, o qual o ordenou secretamente na época em isso era
proibido pelo governo romano. Shimon foi o melhor dos discípulos do Rabi Akiva,
e foi dele que adquiriu a maior porção do seu conhecimento da Torá. Ele viajou
para Bnei Brak, onde o Rabi Akiva ensinava, e ficou lá por treze anos. Depois,
ele mesmo abriu uma yeshivá e começou a ensinar. Mesmo então, ele continuou a
visitar seu professor em Bnei Brak e a receber sua vasta sabedoria. Quando o
Rabi Akiva foi preso pelos romanos, o seu discípulo devoto continuou a
visitá-lo e a estudar com ele. Encontramos uma expressão sobre o profundo amor
entre professor e aluno na maneira como o Rabi Akiva se dirigia ao Rabi Shimon,
chamando-o de “Meu filho!”
Ocorreu certa vez que o Rabi Akiva demonstrou mais deferência por
outro discípulo do que pelo Rabi Shimon, que ficou consternado; ele temia que
seu professor estivesse desagradado com ele. O Rabi Akiva notou o seu mal estar
e lhe disse: “É o suficiente que o seu Criador e eu saibamos da sua grande
força.”
Disso podemos aprender sobre a grande estima que o Rabi Akiva
tinha pelo Rabi Shimon bar Yochai. Ele também ordenou o Rabi Shimon como
professor e autoridade rabínica em Israel.
Rabi Shimon respondeu à estima e ao afeto do professor em espécie.
Muitos anos depois da morte do Rabi Akiva, o Rabi Shimon advertia a seus próprios
discípulos, dizendo: “Meus filhos, estudem os meus caminhos, pois eu os aprendi
com o meu grande mestre, Rabi Akiva!” Mesmo muito tempo depois de não estar
mais junto do seu professor, o Rabi Shimon reconhecia o quanto o seu caráter
havia sido moldado pelo seu instrutor insubstituível.
Seus colegas
Muitos outros eruditos ilustres estudaram junto com o Rabi Shimon
bar Yochai, mas todos o reconheciam como o maior da sua geração. Em muitos
casos, vemos que se submetiam à sua opinião. Em sua humildade, o Rabi Shimon os
honrava como iguais, mesmo quando discordavam de suas opiniões. Seu costume era
primeiro citar a visão de um colega e explicar como havia chegado às conclusões
sobre a questão. Apenas então ele apresentava a sua própria perspectiva,
explicando porque discordava do seu contemporâneo. Mesmo quando a maioria se
opunha à sua decisão, o Rabi Shimon não prestava atenção e mantinha seu
posicionamento sem hesitar. Contudo, quando outros o questionavam sobre qual
decisão haláchica deveriam passar adiante, se a sua ou a da maioria, ele sempre
aconselhava a seguirem a maioria.
Seus trabalhos
O nome Shimon é frequentemente mencionado no Talmude, e em cada
ocasião é uma referência ao Rabi Shimon bar Yochai. Ele transmitiu os
ensinamentos do seu mestre aos seus discípulos da geração seguinte. O mais
famoso dos seus trabalhos é o Zohar, também conhecido como Midrash Yehi Ohr. A
tradição nos conta que ele compôs a obra, junto com seus colegas e discípulos,
após passar treze anos escondido das perseguições das autoridades romanas que
então governavam a Terra Sagrada.
O Rabi Shimon escreveu outros volumes, entre eles: Raya Mehemna,
Safra Det´zniuta, Tikunei haZohar, e Idra Raba Kadisha.
Seus ensinamentos estão gravados
Durante a vida do Rabi Shimon, enquanto a sua yeshivá estava em
funcionamento, os seus trabalhos não foram reunidos em forma de livro. No
entanto, para que os ensinamentos esotéricos sobre a Torá não fossem perdidos,
o Rabi Shimon nomeou o Rabi Abba, um dos seus seguidores proeminentes, para
registrá-los. Originalmente, o Livro do Zohar incluía comentários sobre todas
as Escrituras. Os manuscritos eram tão numerosos que, juntos, formavam uma
carga completa para um camelo. Infelizmente, hoje temos apenas as porções
escritas sobre os Cinco Livros de Moisés.
Alguns historiadores sustentam que o santo erudito Rabi Moses ben
Nachman, séculos depois, encontrou uma cópia do Livro do Zohar na Terra Santa e
o enviou para Catalunha, na Espanha. O livro chegou às mão do seu discípulo, o
Rabino Moshe de Leon, e foi então publicado.
A partir da sua aparição, algumas pessoas questionaram a
autenticidade do livro, mas ele se tornou aceito por autoridades rabínicas, os
quais eram discípulos do Rabi Moses ben Nachman ou de seus discípulos. O livro
continua a ser integralmente aceito hoje em dia.
Seus discípulos
Após a morte do seu professor Rabi Akiva, o Rabi Shimon
estabeleceu uma yeshivá na cidade de Takoa e lá ensinou muitos alunos. Essa foi
a quarta geração após a destruição do Santuário em Jerusalém. Entre os seus
seguidores mais proeminentes estavam: Rabi Yehudah, o Príncipe, Rabi Elazar,
seu filho, Rabi Dostai, filho de Rabi Yehudah, Rabi Zakkai, Rabi Shimon, filho
de Elazar, Rabi Shimon, filho de Yehudah, Rabi Shimon, filho de Rabi Yossi ben
Lakonia, e Rabi Shimon, filho de Mansia. O primeiro dos estudiosos do Talmude
também estudou em sua yeshivá, incluindo o reverenciado Rav, o qual é citado no
Talmude como sendo tanto um Tanna, um erudito da Mishná, quanto um Amora, um
erudito do Talmude.
O Rabi Shimon continuou a ensinar em Takoa e na vila de Meirosn, e
muitos iam em grupos para aprender com ele. Dos discípulos mais destacados, ele
selecionou nove eruditos para estudarem com ele os Segredos da Torá. Esse grupo
era chamado de “amigos”. Juntos, eles se devotaram às realizações espirituais,
e alcançaram grande perfeição pessoal, harmonia, paz de espírito, e
discernimento intelectual. Os discípulos, por sua vez, transmitiram o
conhecimento adiante, e os seus ensinamentos foram caracterizados pela calma e
harmonia que haviam adquirido do seu mestre. Eles foram amigos verdadeiramente
leais, e se amaram e se admiraram profundamente.
O Rabi Yosef Chayim de Bagdá, o Ben Ish Chai, escreve sobre o Rabi
Shimon e o seu círculo interno de discípulos: “E saiba que essa é uma grande
lição ética para nós, aprender os seus caminhos, pois toda a Israel deveria
estar vinculada em amor e irmandade, cuidado e amizade, especialmente durante
os dias da Contagem do Omer.”
Fonte: http://arachimusa.org