Noite de domingo, final da Festa de Shavuot. Fomos à Torre de David, na Cidade Velha, para ver um show
de som e luzes.
Um milhão de palavras não seriam capazes de descrever uma
única imagem do que vi.
Tente descrever, em palavras, o olhar do teu pai no dia em
que saíste de casa. Ou o teu semblante no espelho no dia em que decidiste
desistir de um casamento, de uma amizade, de uma viagem. Tente descrever um
sapato numa escada. Uma cadeira vazia ao lado de uma cama num quarto gelado.
Tente descrever o vôo de uma pomba. Tente descrever alguma coisa, qualquer
coisa, e vais descobrir que a essência da coisa te escapou. Escrevi e publiquei mais de
quarenta livros para tentar descrever uma imagem, uma única imagem, e não
consegui. No entanto, dentro de mim, no fundo de mim, lá onde nenhum ser humano
consegue penetrar, a imagem fulgura, e somente eu posso acessá-la e posso
revê-la quando eu quiser.
As imagens que vi, hoje à noite, na Torre de David, e que
contaram, em 30 minutos, a história dessa cidade pesada, em que religiosos judeus,
cristãos e muçulmanos se esforçam para parecer aos outros mais religiosos que
os outros, jamais sairão da minha memória, esse meu relicário particular de imagens.
O clima das ruínas internas da Torre de David, as pessoas do mundo todo, sentadas
para ver o espetáculo, os membros do Grupo Kadosh, o rabino Saltoun e os amigos
e amigas de Brasília, do Rio de Janeiro, de São Paulo e da Suíça que nos
acompanham, jamais sairão das minhas sinapses, das imagens internas que produzi
a partir das imagens externas projetadas nas paredes de pedra da antiga
fortaleza militar. Nas imagens externas, toda a história de Jerusalém foi
contada, de forma poética e dolorosa, a destruição do templo, as cruzadas, o
império grego, o império romano, o império otomano. Nas minhas imagens internas, a história do Universo foi contada.
Ontem, Erdogan, presidente da Turquia, reuniu 57 países
muçulmanos para formarem um Exército do
Islã com o propósito abertamente declarado de cercar e destruir Jerusalém.
Por quê?
Por que todos os malucos do mundo, como eu e alguns outros,
vem para cá, alguns para construir e outros para destruir? Por que sobre os
céus de Jerusalém estão em guerra eterna os Malachim e os Shedim? O
que há aqui que borbulha, como uma chaleira de água quente? O que há aqui que
faz a gente trepidar, prestes a sofrer, novamente, o Shevirat Kelim?
Os cabalistas sabem o que há aqui, mas ninguém lhes pergunta
o por quê... E por que não perguntam? Porque a resposta dói, a resposta dói
profundamente, e depois de ouvi-la, um ser humano perde a inocência, como Adão
e Eva perderam a inocência depois que comeram do fruto da Árvore do Conhecimento do Bem e do Mal.
Nenhum comentário:
Postar um comentário