“Uma transgressão
não cancela uma mitzvá (mandamento)”, e uma mitzvá não apaga uma transgressão.
Deve-se tomar o bom caminho. Isto é uma regra do trabalho. Mas o mal que se
encontra dentro da pessoa, não lhe permite tomar o bom caminho.
No entanto, deve-se
entender que não é necessário eliminar o mal pela raiz, pois isto seria
impossível. Em troca, somente deve-se detestar o mal, tal como está escrito:
“Tu que amas ao Senhor, odeia o mal”. Deste modo, somente é necessário este
aborrecimento, já que ao detestar o mal a pessoa se separa dele.
Por esta razão, o
mal não tem existência própria, mas sua existência depende do amor e do
desprezo que se sente por ele. Isto significa que se a pessoa sente amor pelo
mal, então fica atrapalhada e cai sob o seu domínio. E se a pessoa aborrece a
“sua” maldade e escapa de sua autoridade, esta deixa de ter domínio sobre a
pessoa.
Então, resulta que o
trabalho principal não reside no verdadeiro mal em si, mas na medida do amor e
na medida do ódio. E por este motivo, uma transgressão promove outra
transgressão. Devemos perguntar o seguinte: Por que alguém merece um castigo
semelhante? Quando cai do seu estado de trabalho, deve ser assistido para poder
levantar-se da sua queda. No entanto, aqui vemos que lhe são agregados mais
obstáculos, para que continue caindo mais abaixo ainda.
Mas a pessoa recebe
mais maldade para que possa chegar a aborrecer o mal, e assim ver de que modo
as transgressões lhe afastam do trabalho de Deus. Mesmo que tenha se aborrecido
e lamentado sua primeira transgressão, ainda não sentiu um tal grau de remorso
que lhe induz ódio contra o mal.
Portanto, uma
transgressão leva a outra; e cada vez que a pessoa se arrepende, de acordo com
o remorso que vai aparecendo, vai manifestando-se o ódio pelo mal até alcançar
sua máxima expressão. Neste momento, a pessoa fica separada do mal, porque o
mal leva à separação.
Disto se depreende
que se a pessoa encontra certo grau de desprezo no nível que lhe acarreta a
separação, não necessitará a correção do que chamamos “uma transgressão que
leva a outra”; e naturalmente a pessoa ganha tempo desta maneira. Quando a
pessoa é recompensada, é admitida no estado de “O amor de Deus”. Este é o
sentido da frase: “Tu que amas o Senhor, odeias o mal”. Somente odeia o mal,
mas o mal em si permanece em seu lugar; e é somente o ódio ao mal que necessitamos.
Isto provém do
seguinte: “Ainda assim, mesmo que Tu o tenhas criado somente um pouco inferior
a Deus”, e este é o sentido do ditado da serpente: “E vocês serão como Deus,
conhecendo o bem e o mal”. Quer dizer que a pessoa se esforça e deseja compreender
o comportamento inteiro da Providência, como o Criador, e a isto se refere com:
“O orgulho de um homem o baixará do seu nível.” Significa que a pessoa quer
compreender tudo com a mente externa, e se não consegue, cai em um estado de
pequenez e insignificância.
O certo é que se a
pessoa desperta para conhecer algo, isto é sinal de que necessita conhecer esta
coisa. E quando aquele que deseja conhecer transcende sua própria mente, e
termina aceitando tudo por meio da fé acima da razão, isto se considera a maior
humildade da que é capaz o homem. Podem ver que na medida em que a pessoa
possui desejo de saber mais, mas aceita isto com fé para além da razão, ou “por
cima da razão”, a pessoa vai encontrando um estado maior de humildade.
Agora podemos
entender como se interpreta o versículo (Números 12:3): “Moisés era um homem
muito manso”, humilde e paciente. Significa que aceitava a humildade na maior
medida possível.
Este é o significado
de Adam HaRishon comendo da Árvore da Vida antes do pecado (original),
que por sua vez se encontrava em (um estado de) plenitude. Ainda assim, não
pôde manter-se mais no grau em que se encontrava, pois não sentia desejo algum
por este estado. Assim, certamente não pôde revelar todos os Sagrados Nomes.
Em conseqüência,
comeu da Árvore do Conhecimento do Bem e do Mal, de acordo com o trecho do
seguinte versículo: “Vem e vê as obras de Deus, terrível em fatos sobre os
filhos dos homens”. E através deste pecado, todas as Luzes se retiraram dele;
portanto, naturalmente foi forçado a começar o seu trabalho do zero.
E o texto fala disto
dizendo que foi expulso do Jardim do Éden, porque se tivesse comido da Árvore
da Vida, teria vivido para sempre. Este é o significado da interioridade destas
palavras. Se a pessoa entra ali, permanece ali para sempre. Isto sugere que
novamente a pessoa permaneça sem desejo algum. E para poder ir e revelar os
Nomes Santos que se manifestam através das correções do bem e do mal, teve que
comer da Árvore do Conhecimento.
Isto se parece com o
exemplo da pessoa que deseja entregar ao seu amigo um grande barril de vinho,
mas vê que seu amigo só tem uma pequena taça. Que termina fazendo? Coloca vinho
dentro da pequena taça e leva para sua casa, onde deposita seu conteúdo em
outra parte. Logo regressa novamente com a taça e volta a lhe servir com vinho.
Deste modo, regressa outra vez a sua casa; e isto uma e outra vez até que
termina recebendo todo o vinho do barril.
Também escutei outra
parábola sobre os dois amigos, um que se tornou rei, e o outro que ficou muito
pobre. O segundo escutou dizer que seu amigo havia se tornado rei, e foi até
ele para lhe contar sua situação de desgraça.
O rei lhe entregou
uma carta dirigida ao ministro do tesouro, para que durante duas horas pudesse
receber todo o dinheiro que quisesse. O amigo pobre chegou à tesouraria com uma
pequena caixa; entrou, e encheu a pequena caixa com dinheiro.
Ao sair, o ministro
chutou a caixa e todo o dinheiro caiu no solo. Isto se repetiu uma e outra vez,
até que o homem pobre disse chorando: “Por que estás fazendo isso comigo?”
Agora sim, disse, todo o dinheiro que tenhas pegado durante esse tempo te
pertence, e podes levar tudo contigo. Não tinhas os vasos para tomar suficiente
dinheiro da tesouraria, e essa é a razão porque eu agi assim.
(Tradução de Clarissa Porto Alegre Schmidt)
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